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Política, cidade, educação: itinerários de Walter Benjamin

Solange Jobim e Souza e Sonia Kramer (orgs.)
312 páginas
ISBN: 9788578660178

R$ 48,40  R$ 29,04

Em "Primeiros socorros", de Rua de Mão Única, Walter Benjamin escreve: "Um bairro extremamente confuso, uma rede de ruas, que anos a fio eu evitara, tornou-se para mim, de um só lance, abarcável numa visão de conjunto, quando um dia uma pessoa amada se mudou para lá. Era como se em sua janela um projetor estivesse instalado e decompusesse a região com feixes de luz."


    Esta descrição poderia servir de método para ler a própria obra de Benjamin. Quem se dispõe a percorrer seus textos de topografia acidentada, repletos de desvios bruscos, "ruas de mão única", perspectivas vertiginosas, encruzilhadas, bifurcações e súbitas passagens, experimenta algo da desorientação do observador diante de um bairro confuso.


    Como enfrentar essa sintaxe disjuntiva, em que as frases não concatenam linearmente as ideias, mas formam "imagens-pensamento", pequenos blocos saturados de sentido? Benjamin parece sugerir, na contramão do senso comum, que a disposição apaixonada não embaça a vista, mas antes a aguça, facultando ao amante a capacidade de distinguir com maior precisão e nitidez o que lhe parece opaco. O processo de decantação da imagem em feixes de luz se dá graças à fulguração do amor. Não se trata aqui de um sentimento açucarado e tolo, mas de uma força potente e rigorosa, capaz de decompor o que se apresenta como inteiro, apostando na ideia de que as coisas só são verdadeiramente apreendidas aos pedaços.


    Cada uma das catorze leituras dos textos de Benjamin, reunidas neste volume pela paixão rigorosa das organizadoras Solange Jobim e Sonia Kramer, recorta e ilumina um pedaço da obra do escritor alemão, a partir de diferentes campos disciplinares. Filosofia, história, literatura, arte e educação perfazem itinerários específicos, maximizando para o leitor aspectos singulares de uma obra complexa e multifacetada.


    Paradoxalmente, o efeito maior provocado pela leitura desses itinerários é descortinar a vigorosa dimensão intertextual da obra de Benjamin. Se a paixão intelectual produz conhecimento na medida em que despedaça seus materiais de análise, convertendo-os em ruínas, estas não valem por si sós, "mas por causa do caminho que passa através delas" ("o caráter destrutivo").


    Esse fio invisível, que secretamente costura correspondências entre os diferentes ensaios deste volume, não está disponível de bandeja para o leitor que apenas folhear burocraticamente as páginas. Há de adentrar o livro, habitar nele, para perceber a caixa de ressonâncias que este produz: "A força da estrada do campo é uma se alguém anda por ela, outra se a sobrevoa de aeroplano. Assim é também a força de um texto, uma se alguém o lê, outra se o transcreve". Benjamin propõe uma mobilização integral do corpo na ação de ler. Aproximar-se de um texto, nesta perspectiva, é reinventar maneiras de estar copresente à obra, vinculado a ela de forma concreta, intensiva, com os recursos da razão, da imaginação e da experiência sensível do corpo que toca, cheira, prova e retraça as letras dispostas sobre o papel.


    Sobre esse assunto, o escritor brasileiro Mario de Andrade teria algo a adicionar. Em carta ao poeta Manuel Bandeira, Mario justifica sua determinação de estudar a obra poética do amigo, sem medo de que os afetos turvem a visão, "porque a minha alma é ainda mais reta quando os amores a iluminam". Desconfio que os pesquisadores que assinam os textos de "Política, cidade, educação: itinerários de Walter Benjamin" renovem esta proposta.


    Convido o leitor a conferir este conjunto vivo de reflexões, partilhadas originalmente em colóquio realizado na PUC-Rio, e a testemunhar o exercício cada vez mais necessário de "pensarmos com".


    Rosana Kohl Bines

    Professora de Letras, PUC-Rio

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